Andrade, Marinho, Raul, Rondinelli, Carlos Alberto e Júnior. Agachados: Tita, Adílio, Nunes, Zico, Júlio César Urigeller |
Ah, que esquadrão tinha aquele Flamengo. Raul, Júnior, Andrade, Carpegiani, Adílio, Zico, Tita, Nunes… Quanto craque! A bola passava de pé em pé, não havia retranca, o futebol era bem jogado. Quanta beleza! Ah, como era bom aquele Atlético. João Leite, Luisinho, Toninho Cerezo, Palhinha, Reinaldo, Éder… Só fera! Os alvinegros esbanjavam categoria, também jogavam puramente no ataque e tinham uma velocidade impressionante. Aqueles dois times mereciam ser campeões do Brasileirão de 1980. Como mereciam. Mas apenas um poderia vencer a decisão daquele ano. Quanta injustiça. Ver um daqueles times com o vice-campeonato seria um sacrilégio, um crime contra o futebol espetáculo. O palco foi o melhor possível: o Maracanã, transformado em Coliseu por mais de 150 mil pessoas que esperavam o embate entre gladiadores e feras. Mas o juiz escolhido fez questão de manchar um jogo histórico, elétrico e tido por muitos como o mais espetacular entre os que decidiram um Campeonato Brasileiro em todos os tempos. José de Assis Aragão virou vilão no dia 1º de junho de 1980 ao dilacerar as feras do Atlético-MG com três expulsões e uma delas sem qualquer razão: a de Reinaldo, o homem que humilhou o Flamengo e sua massa com dois gols mesmo com uma perna praticamente inutilizável. Não fosse a atuação desastrosa do juiz (?), o resultado daquele duelo poderia ser outro. Mas não foi. A taça ficou em ótimas mãos, afinal, o Flamengo também era um time magnífico e jogava um futebol virtuoso. Era o nascimento do esquadrão que seria campeão da América, do mundo e mais duas vezes do Brasil nos anos seguintes. Mas um Galo quase impediu tudo isso. É hora de relembrar.
Pré-jogo
Depois de infindáveis fases (foram três, além da fase final), 44 times na disputa e 304 jogos, o Campeonato Brasileiro de 1980 ganhava uma decisão épica e totalmente sem favoritos. De um lado, o Flamengo, em busca de seu primeiro título nacional e com uma leva de craques do mais alto nível que já havia demonstrado, em 1979, do que era capaz. Com Júnior, Andrade, Adílio, Zico, Tita e Nunes, o time comandado por Cláudio Coutinho mostrou enorme poder de decisão e uma regularidade digna de campeão. Depois de passar bem pelas três primeiras fases, o esquadrão rubro-negro venceu os dois jogos contra o Coritiba, nas semifinais, por 2 a 0 (fora) e 4 a 3 (em casa), resultados que deram ao Flamengo o direito de decidir em casa a finalíssima. Já o Atlético-MG mantinha o poder de fogo que há anos dominava o futebol mineiro, mas que ainda não tinha conseguido um título brasileiro. Em 1977, a equipe chegou invicta na final, mas perdeu nos pênaltis para o valente São Paulo. Em 1980, a equipe era ainda melhor e tinha jogadores de seleção como Luisinho, Toninho Cerezo, Éder e Reinaldo, este sempre iluminado e com o faro de gols extremamente apurado. Constante nas três primeiras fases e sempre letal no ataque, o Galo encarou o campeão invicto do ano anterior, o Internacional. Na primeira partida, em casa, empate em 1 a 1. Na volta, no Beira-Rio, o time alvinegro enfiou 3 a 0 nos Colorados e chegou cheio de moral à decisão.
empre confuso, o regulamento daquele ano previa vantagem de dois resultados iguais ao time de melhor campanha nas semifinais (no caso, o Flamengo, com duas vitórias, contra uma vitória e um empate do Atlético). Tal critério prejudicou o Galo, que tinha melhor campanha geral. Mas não havia tempo para reclamar. No primeiro jogo, no Mineirão lotado, o Atlético aproveitou a ausência de Zico e fez 1 a 0, gol de Reinaldo. O resultado dava aos mineiros a vantagem do empate na partida de volta, no Maracanã. Mas segurar o Flamengo diante de mais de 150 mil torcedores não seria tarefa fácil. O rubro-negro teria a volta de Zico, toda sua massa apoiando e vários craques em todos os setores do campo. A pressão seria enorme e o técnico Procópio Cardoso alertou seus atletas sobre isso, ainda mais depois da tensão que havia sido o primeiro duelo, com provocações e jogadas ríspidas. Para os alvinegros, sair ileso do Rio de Janeiro seria dificílimo, mas não impossível.
Primeiro tempo – Coliseu carioca
Os jogadores do Atlético-MG esperavam muita pressão no dia 1º de junho de 1980. Mas a dose foi alta. Ou melhor, altíssima. O Maracanã pulsava como nunca e as mais de 150 mil vozes vestidas em vermelho e preto davam uma força descomunal ao já forte time do Flamengo. Era impossível para aqueles onze rubro-negros não se enervar e se entregar de corpo e alma num jogo daqueles. Ainda mais se tratando de uma final de campeonato. Cada atleticano tinha um flamenguista em sua cola e outros milhares berrando, vaiando e pressionando. Parecia uma viagem no tempo de volta à Roma antiga, ao Coliseu repleto e sedento para ver a luta entre gladiadores e feras, com o Maracanã como arena e Flamengo e Atlético como protagonistas. No entanto, quem começou a aparecer no espetáculo foi o time de Minas.
Com poucos minutos de jogo, Palhinha chegou perto da grande área e chutou no canto, assustando o goleiro Raul. Mas, aos sete minutos, o Flamengo mostrou que queria fazer daquele espetáculo um monólogo. Após uma roubada de bola, Zico recebeu no meio de campo e iniciou um contra-ataque. A zaga do Galo, em linha, ofereceu a oportunidade perfeita para um craque perfeito efetuar um lançamento perfeito. Zico tocou em profundidade para Nunes, o “João Danado” e artilheiro das decisões, que ganhou na corrida de Orlando e só teve o trabalho de tocar na saída de João Leite: 1 a 0. Delírio puro no Maracanã. Festa nas gerais. Explosão nas arquibancadas. O Coliseu tremia e festejava o início da festa tão esperada pela torcida rubro-negra. A festa era tanta que os jogadores flamenguistas se esqueceram de que ainda tinha jogo. Um minuto depois, o Atlético mostrou sua fera, de dentes afiados e com instinto predatório: Reinaldo. O atacante recebeu dentro da área do Flamengo, escapou de três jogadores num espaço curtíssimo e chutou. Gol. Era o empate. A fera comemora com o punho cerrado, no alto, mostrando que estava ali e não tinha medo algum. O empate era do Galo. E o Flamengo precisava de um gol.
A partir daquele instante, o time da casa centrou suas ações na marcação do meio de campo e evitava a qualquer custo que a bola chegasse a Reinaldo. Andrade e Carpegiani mostravam combate e fôlego para impedir as investidas de Cerezo, enquanto Zico era o toque de qualidade para armar jogadas com a linha de frente em busca do segundo gol. O jogo foi ficando mais pegado, o Flamengo pressionava mais, mas João Leite e a zaga atleticana conseguiam neutralizar os perigos. O Atlético também assustava nos contra-ataques, nos chutes de Éder e Jorge Valença pela esquerda e na presença de Reinaldo, que quase virou num tiro bloqueado por Júnior. Depois de várias chances desperdiçadas e muito nervosismo, eis que o Flamengo voltou a liderar o placar. Aos 44´, em uma falta pela direita, Toninho cruzou na área, João Leite não segurou e Orlando afastou de qualquer maneira. Na sobra, Júnior tentou o chute, a bola prensou em Palhinha, mas voltou para ele. O lateral rubro-negro chutou de novo, a bola foi mastigada em direção à pequena área e encontrou Zico, que chutou alto, sem chances para João Leite: 2 a 1. Nova festa no Maracanã. Perto do fim da primeira etapa, não haveria tempo para uma resposta atleticana. A decisão ficaria para o segundo tempo.
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